quarta-feira, 19 de maio de 2010

Torrente de lugares

"Se serei esquecido?!Não sei!...Mais chato o suficiente pra deixar muito recado!!..."


Os olhos atentavam a ferrovia gasta por toda a sua conjuntura.Do fino telhado vermelho que brigava zéfiros primaveris,caíam telhas retangulares certíssimas,cercadas por begônias magras que brotavam na intersecção dos espaços.Corpos frios,suicidas, rompendo-se em milhões de pedaços na calçada escaldante.Definindo seus protestos estudiosos numa restauração que nunca viria. Mais tarde chegaria o milagre das rodas de prata queimando velocidades e engrenagens,deslizando íngreme sobres os trilhos tortuosos que reinam simularíssimas viagens extensas.
Sorvia o maquinário a cheiro de óleo diesel e força, mesclado às alamedas decrépitas de vales e flores do campo, que o maquinista ao longo do seu trabalho percebido;cunhou.
O barulho brusco e indiferente dos vagões passeavam assim, antigos; troantes,com seu fôlego de apitos inundando janelas.Atingindo pouco a pouco a uniformidade de ritmos sem fim.Trazendo notícias de lugares e bordéis que virariam mais tarde copiosos exemplares. Esta matéria de chumbo e ferrugem,apadrinhava-se nos orvalhos individuais da manhã.
Automaticamente meus passos iam em parte alguma e nada.Buscava em melhor ângulo os mergulhos dos pés,ou estes se desaparecerem no tudo.Na mão direita caía bem meu encantador e quente Irish coffee,que matava o sono crônico e descontrolado da ansiedade...O relógio amplamente disposto às duas da manhã, marcava este lapso coração!
Gastei dois cigarros olhando o retrato triste de minha mãe.Na profundidade cega e desconhecida de seus castanhos,eu percebia aquele certo aprisionamento das minhas expectativas.
Sei que ela nunca me perdoará!
Saí sem motivos pra ganhar o mundo e sacudir as cortinas sonâmbulas de meu ser estático!
Hoje sou pronome de amanhãs e racho com o tempo,sou como carrapato sedento que não larga a presa,que resvala no trópico indulgente do sangue.
Duas da manhã e eu com este modelo de mapa avulso da Europa.Talvez eu viva em Praga,e conheça a cidade das cem torres,ou me destine bêbado nas pedras de cantaria de Melantrichova.Talvez eu toque arcodeom em Viena,outrora sede do império áustro-húngaro que Kafka tanto falava.O monstro de ferro ainda descansa nos trilhos,e as árvores parecem tocar outras sonatas pelos seus galhos elásticos longos.
Ajeito algumas mechas interessantes no espelho quebrado e maciço.O frio é algo que vai se tornando cada vez mais insuportável.
Já não penso ou mastigo o mundo como uma refeição de trabalho,tudo às pressas,sem sentir o gosto de nada,hoje bem mais o risoto perdura na boca.
Abro meu pequeno alforje,tateio com calma o conteúdo da bolsa,bem no cantinho direito retiro um cantil de prata.Aqueço minha garganta de dispersões com leves bebericos,a temperatura do corpo agradece.
Guardo o mapa no bolso traseiro direito e sigo na calmaria das névoas.
Irei descansar serenamente no vagão,e amanhã quem saiba o sol guiará este resto de minha história que ainda não vinguei por desenhos de trilhas...

3 comentários:

Thiago QUintella disse...

Aguardo a continuação, mas lerei os atrasados com Jazz

Tati disse...

Eis-me aqui, comentando o rascunho, na espera do definitivo. Gostei da nota inicial [ainda mais por ela não está no rodapé e contrariar o senso comum de ser nota final], gostei da paisagem do texto [me fez lembrar um filme cheio de detalhes, chamado "O agente da Estação"] e adorei o cenário que não combina com o café. Sim, sim, gosto dos detalhes. Todos eles!
Beijos querido!

P.S.: sobre o filme, aqui: http://www.adorocinema.com/filmes/agente-da-estacao/

Jordan Duailibe disse...

Engraçado você ter comentado isso Tati,porque desconhecia tal filme.E o roteiro parece ser bem interessante também,sem aquelas coisas hollywoodianas.Vou até procurá-lo.