terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

E Cecília Meireles vive

De repente madrugada séria vinha surgindo,uma concordância de lua para ninguém botar defeito.Fome e vontade de sentar nos asseguravam plenamente.Procuramos uma pizzaria na Lapa.Febre de pessoas que trafegavam e se negavam a ir embora,carros afobados,briga sem ganhadores,pedestres e carros numa luta inquieta de espaço,buzinas lancinantes sacudiam os mais afoitos.Raiva dos transeuntes agressivos.Subimos a escada da pizzaria cansados.Trocamos risadas,histórias,olhares,mas em tudo a fome não passava.Ela de repente falou que ia se levantar,e sua garganta gratuita e bradante de poesia pediu atenção aos que comiam,e como um palradora inconsequente,saiu metralhando seus versos audíveis em cima de uma cadeira.Uma voz se vinha ao meu lado baixinho,dizendo:-Tira ela dali,tira ela dali.Vai dar merda,tô falando!"Eu canto porque o instante existe e a minha vida está completa.Não sou alegre nem sou triste:sou poeta."-Fingo que não escuto,deixo a continuação dos versos seguir com certa individualidade natural.-Alguém vai reclamar,o pessoal vai vaiar,ainda dá tempo de tirá-la dali."Irmão das coisas fugidias,não sinto gozo nem tormento.Atravesso noites e dias no vento.Se desmorono ou se edifico,se permaneço ou me desfaço,— não sei, não sei. Não sei se fico ou passo."-Calma...O início já foi feito,as pessoas estão todas compenetradas,está vendo??Não posso mexer em nada agora,só esperar o julgamento da platéia que assiste.-Outra voz se crescia também audível,uma voz também feminina e seca.-Chamem os seguranças!Chamem os seguranças!-Assim secamente."Sei que canto. E a canção é tudo.Tem sangue eterno a asa ritmada.E um dia sei que estarei mudo:— mais nada.Cecília Meireles, gente"-Uma pausa longa se fez no salão antigo,nenhuma crítica,nenhuma risada,nenhum inconformismo,apenas o vento indefinível,necessário no calor carioca, acariciava as portas portuguesas.Um bater de palmas forte,surge de um senhor gordo barbudo à frente,demais palmas são refletidas mais atrás,ela começa a conferir o nível de abraços que ofertam carinhos,e o sorriso infantil salta,da garota sapeca que se faz natural em todo ambiente,mais palmas adiante,agora perto dos garçons que assavam uma muzzarela.A mulher que chamou os seguranças não entendeu nada dos versos,e além de não entendê-los;matava amplamente a cultura popular,com seus dizeres reacionários e pútridos. Quão resquiciosa e frágil é a cultura,em todos os seus segmentos e níveis.Vivemos naqueles dias de meu Deus...

2 comentários:

Unknown disse...

Lindo amor...só vc mesmo para relatar tão pura e singela emoção que nos consumiu neste dia de Cecilia!!! Sim,sim ela vive em todas as pessoas que ainda acreditam na cultura Brasileira!!!

Jonathan Botelho disse...

Mto bom teu blog, nesse mundo d "bbbs"
flw,