domingo, 16 de março de 2008

Primeiros versos

"Antes de amar-te, amor, nada era meu.
Vacilei pelas ruas e as coisas: Nada contava nem tinha nome:O mundo era do ar que esperava. E conheci salões cinzentos,Túneis habitados pela lua,Hangares cruéis que se despediam,Perguntas que insistiam na areia.Tudo estava vazio, morto e mudo,Caído, abandonado e decaído,Tudo era inalienavelmente alheio,Tudo era dos outros e de ninguém,Até que tua beleza e tua pobreza De dádivas encheram o outono..." (Pablo Neruda)

Ah o amor...o amor...Como entender esta máquina conflitante, tão grande??Que singelo senhor,nos enlouquece tanto assim,e interroga nossos corações acesos?A minha história não é muito diferente,e começa mais ou menos assim.Eu deveria contar aí com meus oito ou nove anos de idade.Tinha um kichute pra ir à escola, com aquela trava na sola característica,e o imenso cadarço que ia se desenvolvendo para as canelas.Lembro até que eu conseguia passar três voltas nelas facilmente.Era tempo do: "New Wave"ombreiras,relógio Champion,Atari e o estilo musical passava por bandas do gênero: new romantics,góticos, metaleiros,dentre outros.O pop era bem mais melancólico e foi a partir desta época que comecei a gostar de: Echo and The Bunnyman,Joy Division, The Cure,The Smiths.Saía de casa todos os dias após o capítulo de caverna do Dragão na tv .Nas costas eu carregava uma mochila do He-man,e na mão esquerda uma merendeira com suco de caju e biscoito Maria.
Na escola eu era sempre um dos primeiros a chegar.Tomava meu lugar sempre ao fundo,nas últimas carteiras que ficavam à minha direita.Eu detestava comparecer às aulas,e vestir o uniforme azul desconfortável.
Me sentia horrivelmente pequeno,tremendamente pequeno.Quando ia atravessando a porta,e recebia aquele encaramento exasperante, de outros colegas curiosos que me punham à vista.Arriscando negociantes e convictos de que eu era um Et.Eu não era de revidar olhares.E nem minha timidez boba,roubava qualquer coisa de sobrevivência de palavras na boca.Luísa sempre chegava mais tarde um pouco.
Vinha acompanhada da mãe que também era professora da escola.
Eu era todo Luísa.
Luísa tinha um cheiro que me convidava a conhecer fadas,dragões,reinos fantásticos do desconhecido.Miscelânea de fantasias,que fazia da estatística a suficiência maior de meu coração.
E foi naquele manhã de quarta-feira,que inspirado e afoito me tomei a pegar do papel, que ficava dentro da pasta preta;e tropecei algumas letras vacilantes no corpo do texto.Ela me respirava um sabor doce de sabonete,e suas mechas irmãs pendiam na padronagem do ombro.Vivia sorridente pelos cantos,trocando fofoquinhas com as amigas,investigando a vida alheia.Na minha confidência, eu sabia que Luísa era minha platonice inatingível,o terror de minissaia que preocupava o mundo.E por saber desta gentileza partidária,é que de dentro me saía as armas mais interjetivas.Me descobri poeta naquele dia,fatalmente matando sílabas nas linhas.Levantei astuto,irmanado na idéia de um espião russo,e, após favoralmente traçar condições estratégicas para meu romantismo censurante;deixei a folha convivente na sua pastinha rosa.Hoje tudo ficaria mais fácil,com este conceitualismo internético de enviar um e-mail ou torpedo anônimo.Mas talvez a repercussão dinâmica não fosse a mesma.Não existiria aquela taquicardia momentânea, de poder ser descoberto a qualquer tempo.O suor frio se interferindo vago,ou um ficar sem graça pelo ocorrido.Decididamente o perigoso protestava todas as suas verdades.
A professora passava o dever de casa,quando ela procurando algo para anotar,percebeu o papel
branco preso entre livros.Leu cada trecho desembaraçando a escrita ruim.Eu do fundo percebia tudo,o coração quase saltando pela boca.Passado o texto,olhou com calma hesitação para a turma,correndo olhos pelos cantos,tentando adivinhar quem teria sido o ousado mentor.
E na saída da aula Luísa esbanjava felicidades,Luísa designava seus cânticos provisórios,e eu sabia de todo o porquê.Noticiava às amiguinhas com aquele seu estado de graça,o poeminha que havia recebido na turma,de seu misterioso admirador.
Eu me seguia a alguns passos atrás,medroso,no drama da timidez composta.Esquecido por trás de meus grandiosos óculos.Maldita timidez.
Luísa,se algum dia este texto lhe alcançar em mãos,saiba que é daquele mesmo sujeitinho calado,que ficava sempre ao fundo sem graça na sala.E que não levava as aulas tão a sério como era pra ser levada,e que até hoje guardou aquele seu sorrisinho doce esticado,armando vida para as meiguices do amor.A timidez se foi para o espaço,mas a poesia e tua lembrança não...

2 comentários:

Tati disse...

Por que a música nos causa tanta aflição, amor, raiva, e essas coisas todas? POr que Echo & The Bunnymen, Smiths e Cure é tão especial?
Ai, o amor... risos!!!!

VOCÊ AINDA NÃO MANDOU SEU NOVO ENDEREÇO PARA EU PODER MANDAR MEUS PRESENTINHOS!!!!

BelaCavalcanti disse...

MUITO lindo, seu Jordan :)