quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Meia hora


Eu ainda conseguia vê-la profundamente vívida ao longe,no terceiro andar com tijolinhos.Tão operante no seu andar de sala,passeando pelos corredores estreitos e acabando sua última refeição.Ficava com seus burburinhos reclusos,um ar de pensativa,lançando os ternos olhos miúdos preenchidos na data.Depois puxou de uma escada e foi trocar grande parte dos livros empoeirados da estante, jogando um por um no chão, não queria mais nada daquilo,venderia tudo para o sebo virtual;assim havia me dito.Distraída e descalça conferiu seus últimos compromissos;largou suas camadas de lições de estudos sobre a mesa de vidro temperado.Dormitaria aí por dias seis livros enciclopédicos loucos por serem folheados.Ajeitou a pequena poltrona vermelha até perto da tv e depois ficou brincando canais por tédio. O que eu sentia era um misto de: mistério,histeria e frio no local;que tocava grande parte os olhos úmidos.De tentar correr ainda algumas extremas lições,de importâncias que ainda poderia deixar pela casa.Na vontade doente e louca que eu tinha de estar por ali e eu não podia, e se ligasse não responderia aos meus chamados,ou qualquer tipo de convite mais ousado que eu lançasse.Eu sentia o meu vazio;ali na pequena rua que esperava,cercado pela feira de frutas e hortaliças com senhoras ansiosas brigando pelo melhor preço,e os carregadores descarregando cada vez mais caixas com pressa,na cadeia de semáforos que cobria a esquina sombreante,e ruídos de carros correndo seu último minuto pro trabalho.
Meus olhares agora, são e serão sempre;olhares exilados.Que passeiam por teus cabelos soltos, e que ainda recolhe a mesma vermelhidão chispante de fios; de conceber-me ao teu volume de cachos caindo até os ombros, pra mais tarde amarrá-los por causa do calor.
E a grande janela larga que lhe ocupa,abrindo rapidamente para corrente de ventos,vai descobrindo o corpo reservado que se esconde.Você rega primeiramente o caule das plantas com muito cuidado,aguando grande parte da raiz fresca e que aquilo me cabe um quê louco de ajudar,de amanhã ser minha vez e não se preocupe:os lilases são por minha conta.As suas pernas,o seu rosto,a brancura nua dos ombros solícitos no cumprimento da rega, gravava grande transposição particular de minhas saudades.
Você conversa uma música calma ao longe,falha;que logo tento descobrir pela leitura de lábios.
E que me sai um cantar assim tão baixinho nos lábios,um passsarinho iluminado, presenteando seus versos reticentes no mármore do prédio, sem que houvesse qualquer refreamento de meus registros amantes,qualquer coisa mais grave,do teu resto de voz e caderno de notas que chegou até mim.
Vestiu seu vestido azul tão flutuante que caminhava no sabor dos ventos, e me deu o caminho de conversações e retrospectivas que senti e vivi. Eu tinha uma impressão quase devoradora na sua maquiagem que casava meu coração,e eu me reprovava pelos medos plásticos e discursos existenciais e novos que mitigava na pele.Naquela maquiagem leve que se redistribuía por todo seu rosto de fêmea,que ganhava ali os meus horários de pulmão,aumentava meu apetite de confissões,daquilo que eu nunca poderia declarar ao longe...A não ser, o meu abraço de olhares que conta histórias no apartamento...

5 comentários:

Tati disse...

"reprovava pelos medos plásticos" é de uma delicadeza literária que carrega metáforas, eufemismos, sinestesias... carrega um amontoado de significação, e ainda assim parece leve, ainda que o texto pede para não ser.

Rayssa Motta disse...

Excelente, jordan.

Thiago Quintella de Mattos disse...

Abraços de olhares, bem diferente do voyerismo que seria interpretado pelo vulgo!
Demais Jordan!!

Thiago Quintella de Mattos disse...

Jordan, de quem é o quadro ilustrador de seu texto?

Plácido Rodriguez disse...

A fúria está de volta!