quinta-feira, 27 de março de 2008

Fome de horizontes

Vai, se você precisa ir Não quero mais brigar esta noite Nossas acusações infantis E palavras mordazes que machucam tanto Não vão levar a nada, como sempre Vai, clareia um pouco a cabeça Já que você não quer conversar.Já brigamos tanto Mais não vale a pena Vou ficar aqui, com um bom livro ou com a TV Sei que existe alguma coisa incomodando você Meu amor, cuidado na estrada E quando você voltar Tranque o portão Feche as janelas Apague a luz e saiba que te amo...(Quando você voltar-Legião Urbana)
Ventava muito nesta quarta-feira de abril.As fazendas de canteiros proveitosos e ilustres;tinha parte de seu plantio de tomates destruída,e telhas arrancadas com a fúria da natureza.Os mourões escondidos,destacados ao longe da várzea, que por muitas das vezes morgaram àquele balançar infantil merecido;à beira dos rios nas tardes,vinham agora com ritmos diferenciadores, explodindo febris ao sabor dos zéfiros confusos, abrindo calçadas entre os pequenos arbustos pérvios.O portão azul que dava pro pátio,ainda permanecia envergado e triste,inoperável;uma certa marca presente de bota manchando o meio do corpo, um carimbo marrom destacável assumindo.
Apenas as dobradiças finas seguravam a velha madeira,permitindo todo aquele suportar de peso grotesco.Saracoteava agora uma estranha dança d'água ao limbo lá fora,cortando sons sensibilizados ante aos chuviscos que invadia manguezais ali perto.No manso corredor,ela esperava desgostosa qualquer coisa de sua voz,qualquer notícia dele que não vinha.Uma sinfonia estranhíssima ia acolhendo o tempo desgastado: era a mistura das dobradiças,conjuntamente com o apiário de abelhas atarefadas, nos roseirais de seu campo.
Sabia que tão cedo ele não voltaria, e seu coração então parecia mais apertado no peito,uma dor definhada e capitalista que apagava os sorrisos na janela.
Sabia de suas brigas tolas,da agitação de discussões na mesa do jantar com o dedo em riste,de greve de sexo em semanas,da ameaça de separação entre ambos.Naquele momento ela queria era parar tudo,e esquecer que a única coisa que ficava lhe cogitando a cabeça;era de que ele deveria estar agora entre amigos,no barracão de madeira contando seu vocabulário de histórias pra terceiros,sob a fogueira crua e destilados quentes lhe abandonando o frio.Sabia que mais tarde dali,ele ia procurar suas madamas costumeiras da zona.Esse grande filho da puta que iria voltar com o cheiro de sexo de outras na sua boca,com o suor amanhecido de perfume barato por todo o corpo.Por muitas das vezes ela desenganou-se de suas traições,arrumando a casa,lustrando móveis,trocando receita de bolo com a vizinha,acompanhando a novela frequentemente.A realidade maior, é que ela não queria ter tempo pra preencher ou arrastar tantas horas com tudo aquilo.
O portão canta fininho,o vento levanta o chapéu de um salto,passos de botas se seguem ao som da música de Cartola:"Esquece meu amor vê se esquece...acontece que eu já não sei mas amar..."Ela lá dentro do quarto,fingindo um sono próspero que não vinha nunca,apenas parava pra escutá-lo.Ele viria cinza,torturado no perfume das meretrizes e beijos; que arrancavam-lhe tantos outros suspiros.Arranhava os dedos calejados no concreto velho da casa tentando se apoiar,transbordava cabarés alegres e cachaça caseira.Atacou um resto de pão amanhecido e acendeu um cigarro.Pensou rudemente na vida.Foi chegando bem de mansinho e calado,parou em frente à porta do quarto.E foi tendo milhões de maus pensamentos ao vê-la dormir,seus olhos agonizavam sexo,a exuberância freguesa que se comprava na cama,e ela se permitia,e se arrependia,e se mostrava toda pra ele,ausente das brigas bobas nas memórias subtraídas.E ele então se deitou ao seu lado,e foi colhendo o seu perfume pela lingerie vermelha,recebendo aquele convite de carne aparente,querendo banhar-se daquelas mechas morenas.Foi chegando tão bobo,deitando a bebida vazia de lado,arqueando um sorriso encantador que ela não viu,arranhando sua barba grande e sussurrando tantas sacanagens no ouvido.Ele queria tudo dela,do que se escondia no meio das suas pernas,do que iria fazer com ela...Mas ele em nenhum momento a possuiu covardemente,nem a destratou e nem lhe dirigiu as mãos grandes sobre o rosto.Ao contrário, transava loucamente de escândalos,na morada doentia deles como criaturas completas.Transava a agonia forte de seus erros,das vergonhas guardadas no silêncio.E acabou o gozo com seus dilemas,descendo a carne estúpida nos lençóis molhados.Tentando entender...entre seu choros secos,e todos aqueles receios e desesperos que reinavam suas leituras,a própria compreensão que desconhecia.Ele queria apenas que ela naquele momento fosse: mãe,tia,prima,irmã,amante,ou ela mesmo pra consolar seus delírios.Que lhe apresentasse fartamente mais calmo,os seios doces para dormir encolhido.E já cansado de aprontar e descer pela solidão da noite acesa que não tinha fim,descansou suas lágrimas esperançosas nos montes,enquanto ela seguia o mesmo caminho;chorando escondida de lado, no mistério do quarto em que tudo se desconhecia...

3 comentários:

Tati disse...

Mr. Jordan, me explica: por que insistimos em tornar nossas histórias confusas demais, urgentes e adolescentes?!

(eu não escuto mais Legião como antes... mas ainda é a banda que me faz sorrir, foi a banda que me fez gostar de músicas boas, foi a banda que me fez achar Smiths muito foda... e é engraçado como um refrão ainda me faz sorrir!)

P.S.: e a vida aí em Curitiba, como está?! E a vida de namorido?! Aaaaaaaaaaa, me conte!
Saudades. Juizo!

Jordan Duailibe disse...

Acho que a realidade ou fome maior pra isso Tati,vem dessa estrutura nova que está sendo batizada de:“grup”, uma contração de grown up (adulto),pelo menos é este o exercício que está se crescendo tanto.Somos de uma geração de ipods, internet,temos nossos filhos,trabalho,responsabilidades,
mas quando atravessamos a linha do adolescente:a confusão se generaliza.Como diria melhor Spit,se ele dissesse,eu acho;ele se traduziria daquela velha forma:Somos adultos com nossos empregos de dia;mas a noite somos eternas crianças,somos confusos,o amor e suas confusões,adoramos desenho animado e filmes em preto e branco,adoramos sair pra uma festa,rock e azaração,somos eternos adolescentes,e portanto,aquela coisa de dois pesos e duas medidas em relacionamentos.A vida aqui está ótima,Drica ainda está em Floripa e eu já estou morrendo de saudades :)bjao Tati,ah!E as músicas do Legião tb vez ou outra me tira um sorriso nos refrões

Ju disse...

um tesão de texto. essa é a única expressão que me vem. muito bom lê-lo, muito bom.
vc mora em Ctba? caraca, precisamos nos conhecer!!!
beijos